domingo, 24 de fevereiro de 2013

Crítica do dia!

DURO DE MATAR - UM BOM DIA PARA MORRER (A Good Day to Die Hard, EUA, 2013).
Direção: John Moore.
Com: Bruce Willis, Jai Courtney, Sebastian Koch, Yuliya Snigir, Mary Elizabeth Winstead. 104 min.
   Juntamente com Roger Murtaugh e Martin Riggs, o policial nova-iorquino John McClane é o mais icônico personagem dos filmes de ação. No entanto, ao longo dos seus respectivos filmes, os referidos homens-da-lei tiveram desenvolvimentos bem diferentes. Em Máquina Mortífera, tanto o original como as sequências foram dirigidas pelo mesmo cineasta: Richard Donner. Em Duro de Matar, apenas dois dos cinco filmes foram orquestrados por um mesmo diretor - no caso, John McTiernan, processado em 2010 pela justiça americana sob a acusação de contratação de um conhecido detetive particular para a violação do sigilo telefônico de um produtor de Rollerball. Ademais, Riggs e Murtaugh realmente sofrem com os limites impostos pela idade avançada, algo bastante discutido no quarto filme da franquia. McClane, porém, segue curso análogo ao de Benjamin Button: inicialmente, mais frágil e suscetível a escoriações, tiros e explosões, para, em seguida, alcançar uma posição de absoluta indestrutibilidade. E toda essa pompa do personagem - já demonstrada no 4.0 - em nada contribui para a elevação dos níveis de tensão tão presentes nos três primeiros filmes da série.
   Apesar da 'troca de cadeiras' do primeiro Die Hard para o segundo, muitas coisas boas foram preservadas: a ambientação claustrofóbica, a sensacional trilha sonora, a sagacidade de McClane. Em Duro de Matar - A Vingança, McTiernan retorna e amplia o campo de ação - uma inteligente mudança de argumento para afastar a franquia do lugar-comum. Funcionou. Há quem discorde, mas A Vingança tem duas das mais bem sacadas cenas de ação de toda a pentalogia - as excepcionais sequências do Harlem e aquela em que McClane detona os bandidos no elevador. Em 4.0, a série perdeu toda a sua essência. Mesmo com a filha sob a posse de terroristas, McClane mantinha a pose, seguro e cheio de si - uma postura absolutamente contrastante, por exemplo, com a preocupação manifestada com a esposa, quando a mesma encontrava-se em um avião controlado por militares corruptos. Mais: a experiência, por assim dizer, havia feito de McClane um ser capaz de executar as mais inacreditáveis peripécias - alçar um táxi contra um helicóptero, afinal, não é para qualquer um; sobreviver ao ataque de um caça, muito menos.
   O título é muito bacana. ´A Good Day to Die Hard` soa bem, não? Mas, infelizmente, é uma das poucas coisas boas neste DURO DE MATAR - UM BOM DIA PARA MORRER. Após tomar conhecimento da prisão do filho (Jai Courtney) na Rússia, McClane decide atravessar o oceano para ajudá-lo e acaba se envolvendo num complexo plano da CIA. O enredo chinfrim até prende a atenção do espectador por alguns minutos, mas, ao direcionar McClane para um plano secundário, tendo em vista que a ação gira em torno da competência do filho, o negócio desanda. É de uma tristeza inenarrável ver o personagem praticamente suplicar por um envolvimento maior na trama. A inteligência de McClane agora é dispensada para o descarregamento de armas automáticas, uma vez que, quando o roteiro decide implementar algum 'projeto' de suspense, a simples frase ´Aí tem coisa.` resolve. Visualmente, a perseguição inicial é muito bem orquestrada, mas, para efeito de credibilidade junto ao público, pouco verossímil. O desfecho do filme então... A computação gráfica nada (ou pouco) tem a ver com Duro de Matar - a começar pelo próprio protagonista e sua total falta de familiaridade com tecnologia.
   Duro de Matar inspirou e até hoje influencia o jeito de fazer filmes de ação (já ouviram falar de Duro de Matar na Casa Branca?!), e, mesmo com Bruce Willis garantindo o prosseguimento da franquia, sugiro, com muito pesar, que hoje seja um bom dia para que a mesma morra.








   

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Crítica do dia!

AS AVENTURAS DE PI (The Life of Pi, EUA, 2012).
Direção: Ang Lee.
Com: Suraj Sharma, Irrfan Khan, Rafe Spall, Gérard Depardieu. 127min.
   O livro Max e os Felinos, do autor brasileiro Moacyr Scliar, narra a saga de um judeu que, às voltas com os terrores da Segunda Guerra Mundial, embarca num cargueiro alemão rumo ao Brasil. No trajeto, o navio naufraga e Max é obrigado a dividir o pequeno espaço de um bote salva-vidas com um jaguar - que também estava no cargueiro, juntamente com outros animais de um circo. Há, aqui, uma alegoria que emula as relações entre o povo brasileiro e o Regime Militar, uma vez que o texto foi escrito à época da ditadura. O canadense Yann Martel, aproveitando-se do mote criado pelo escritor brazuca, redigiu o premiado ´A Vida de Pi` - Moacyr tomou conhecimento do plágio por intermédio de um artigo do jornal britânico The Guardian. Há, claro, uma diferença aqui e ali, mas a trama é, essencialmente, a mesma - na iminência de uma crise financeira, a família de Piscine Molitor Patel decide mudar-se, a bordo de um cargueiro japonês, da Índia para o Canadá, levando consigo o negócio que garantia a subsistência do clã: um zoológico com uma variedade ímpar de bichos. É claro que o navio nipônico afunda e Pi, assim como Max, terá de compartilhar o diminuto território de um bote com quatro animais selvagens - uma zebra, um orangotango, uma hiena e o deslumbrante tigre-de-bengala Richard Parker.
   O visual deste AS AVENTURAS DE PI é impecável. Apesar de boa parte das cenas marítimas terem sido rodadas em estúdio, o 3D utilizado pela equipe técnica é de uma eficiência irretocável. A sequência do naufrágio é intensa e chocante - repare, em especial, no momento em que Pi assiste, em meio a um quase afogamento, à submersão do Tsimtsum. Aqui, os efeitos especiais não são gratuitos - até o espetacular salto de uma baleia tem algum impacto sobre o enredo. O ápice digital, porém, é alcançado na construção de Richard Parker - inacreditavelmente real, o tigre é resultado de um trabalho da Rhythm and Hues Studios, empresa responsável também pelos efeitos de X-Men - Primeira Classe e Branca de Neve e o Caçador.
   A escolha do elenco foi acertadíssima. Suraj Sharma (Pi) suporta com méritos a responsabilidade da atuação solitária. Tabu, uma estrela da Bollywood - a indústria cinematográfica indiana -, exibe amabilidade e elegância no papel da matriarca da família Patel. Até a abrupta sacada de Tobey Maguire da equipe de atores e a escolha de seu substituto para a interpretação do escritor canadense que entrevista o Pi adulto, foram, de certo modo, benéficas à produção.
   AS AVENTURAS DE PI é um daqueles filmes que permitem inúmeras interpretações. A multiplicidade de crenças do personagem principal, por exemplo, pode ser vista como um vislumbre da possibilidade de religiões díspares conviverem em harmonia. Santosh Patel, o pai de Pi, ao defender que a fé cega e desenfreada é reflexo da ignorância, reforça a idéia de que Ciência e Religião podem, também, coabitar em concórdia. A saga de Pi é uma metáfora para as dificuldades da vida - na qual, infelizmente, todos nós estamos sujeitos a tragédias e infortúnios.

 
 

sábado, 22 de dezembro de 2012

Crítica do dia!

O HOBBIT - UMA JORNADA INESPERADA
(The Hobbit: An Unexpected Journey, Nova Zelândia/EUA, 2012).
Direção: Peter Jackson.
Com: Martin Freeman, Ian McKellen, Richard Armitage, James Nesbitt, Cate Blanchett, Hugo Weaving, Andy Serkis. 169 min.
   Quando fui ao cinema para ver O Senhor dos Anéis - A Sociedade do Anel, eu nada sabia acerca do universo mitológico criado por J.R.R. Tolkien. Saí da sala completamente extasiado e com a certeza de que havia visto um dos melhores filmes de toda a minha vida. Algum tempo depois, adquiri os livros e o DVD do filme - que foi visto e revisto dezenas de vezes. Mas, cerca de dez anos após esses acontecimentos, filmes e mais filmes na bagagem, admito que optei por não criar expectativa alguma em relação a este O HOBBIT - até mesmo porque eu já havia me decepcionado bastante com O Senhor dos Anéis - As Duas Torres. Assim, fui ao cinema na esperança de ver apenas um bom filme. E foi o que vi. Nada mais.
   O HOBBIT é uma adaptação do livro homônimo de 1937, cujo texto tinha, como público-alvo principal, crianças e adolescentes. Aqui, não há toda aquela atmosfera soturna que permeia a trilogia do anel. Para compensar, existem similaridades argumentativas: forma-se uma comitiva, constituída por 13 anões, um Hobbit (Bilbo Bolseiro, no caso) e o mago Gandalf, cujo objetivo é resgatar o reino de Erebor, tomado pela mais apavorante das criaturas da Terra-Média: o dragão Smaug. Ao contrário das críticas, as cenas iniciais, nas quais são apresentados os anões e sua educação classuda, de forma alguma arrastam-se pela tela. As referidas sequências são divertidíssimas, evidenciando a afinidade entre os integrantes do elenco e, em particular, destacando o excelente timing cômico do ator inglês Martin Freeman, extremamente à vontade ao assumir o papel outrora interpretado pelo também inglês Ian Holm. Alguns fãs até fizeram campanha para que o astro de O Guia do Mochileiro das Galáxias participasse da produção. O trabalho de Freeman só não é o melhor do filme porque o Gollum de Andy Serkis é insuperável. O personagem, por si só, já é fascinante; a técnica e o esmero de Serkis, contudo, potencializam a presença do mesmo. A sequência do jogo de charadas encabeçada por Bilbo e a criatura é genial - um exemplo de como um texto bem escrito pode sobrecarregar de dramaticidade uma cena simplista, na qual a computação gráfica é um recurso usado na medida certa, sem arrojo, para fins de humanização de um personagem.
   As semelhanças com a saga do anel não se restringem apenas ao roteiro. No que diz respeito aos quesitos técnicos, a fotografia, com seus planos abertos cobrindo, a longa distância, o trânsito da comitiva, é facilmente reconhecível; a trilha sonora de Howard Shore, por sua vez, revisita temas consagrados - uma escolha acertada, diga-se.
   Ao abordar apenas 6 dos 19 capítulos do material original neste primeiro filme (serão três, no total), Peter Jackson procede de forma contrária àquilo que foi executado no início do presente século: a epopéia do anel consiste em cerca de 1600 páginas, ao passo que O HOBBIT é uma espécie de pocket book com pouco mais de trezentas. Assim, o que se fez foi ´esticar` uma estória, e, como resultado, temos a infeliz presença de sequências completamente desnecessárias - a cura de um pequeno bichinho perpetrada pelo destrambelhado mago Radagast, por exemplo. O tempo de projeção de O HOBBIT foi, inclusive, alvo de críticas bastante criativas. Chegou-se a sugerir o lançamento da ´versão condensada do diretor` em Blu-Ray, em oposição à popular ´versão estendida`. Talvez a prolixidade do filme seja justificada pela intenção óbvia de se estabelecer uma conexão com o que já foi feito: as ´pontas` de vários personagens que, à época da feitura de O HOBBIT, possivelmente eram apenas idéias na cabeça de Tolkien, corroboram tal hipótese.
   A despeito dos comentários sobre a duração do filme, boa parte das críticas estão centradas na tecnologia de filmagem e exibição - o HFR (High Frame Rate), em que são mostrados em tela 48 quadros por segundo, ao invés dos tradicionais 24. Muitos espectadores reclamaram da sensação de aceleração das sequências. O fato é que, por ser uma inovação, digamos, em estágio inicial de desenvolvimento, o HFR não deve ser o alvo-mor dos ataques por parte da comunidade cinematográfica. A verdade é que O HOBBIT é um filme visualmente belíssimo e, no entanto, desprovido de algum significado maior.

domingo, 7 de outubro de 2012

Crítica do dia!

A MULHER DE PRETO (The woman in black, Reino Unido, 2012).
Direção: James Watkins.
Com: Daniel Radcliffe, Ciarán Hinds, Janet McTeer. 95min.
   No início da década de 90, uma personagem peculiar 'amedrontava' os homens da pequena cidade baiana fictícia Santana do Agreste: a Mulher de branco da novela global TIETA revelou-se, no final das contas, uma simples criatura mundana desesperada por sexo. Para a infelicidade de Daniel Radcliffe, a antagonista cromática da assombração fogosa fake citada acima é verdadeiramente perniciosa. Em seu primeiro longa após o encerramento da saga HARRY POTTER, o ex-astro-mirim encarna o papel do advogado Arthur Kipps, que, desestabilizado pela morte da esposa durante o parto do filho Joseph e às voltas com dificuldades financeiras, vê-se obrigado a deslocar-se para as brenhas britânicas a fim de regularizar a papelada da mansão Eel Marsh House. Uma vez nos cafundós da Inglaterra, Kipps depara-se com um fantasma local associado a tragédias envolvendo crianças da região.
   As locações, os cenários e a direção de arte deste A MULHER DE PRETO são primorosos - algo já esperado de uma película da HAMMER FILMS, a cultuada produtora inglesa de filmes de horror B fundada em 1934, 'afundada' no final da década de 70, devido, entre outras coisas, à impossibilidade de competição com filmes de terror americanos, e ressuscitada em 2008. Há um notável apuro técnico nos figurinos, na caracterização de época (início do século XX) e na construção de um ambiente soturno. Em contrapartida, o espectro que dá nome ao filme não é dos mais assustadores: a vila, a pequena faixa de terra que cobre-se de água periodicamente e o próprio casarão são muito mais apavorantes. Até Mrs. Daily (Janet McTeer), ao incorporar um conveniente espírito, provoca mais pavor no espectador.
   As dúvidas quanto à interpretação de Radcliffe logo são deixadas de lado: cônscio do personagem que assume, o eterno bruxo faz um trabalho competente - condizente com a figura dramática criada pela conhecida escritora britânica de livros de mistério Susan Hill. Por outro lado, as mudanças cometidas no texto original da literata inglesa possivelmente foram responsáveis pelo surgimento de inacreditáveis furos de roteiro: como é possível um cadáver permanecer em tão boas condições de conservação após tanto tempo? Se lama fosse revigorante, os porcos seriam imortais.
   Apesar de todos os defeitos, a marca 'Daniel Radcliffe' é forte e A MULHER DE PRETO obteve um excelente desempenho nas bilheterias. Resultado: a HAMMER FILMS já prepara um novo lançamento para 2013 - 'The Quiet Ones' versa sobre um polêmico experimento conduzido pelo professor interpretado por Jared Harris.
 
     

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Crítica do dia!

VINGANÇA ENTRE ASSASSINOS (The Tournament, 2009).
Direção: Scott Mann.
Com: Kelly Hu, Ving Rhames, Liam Cunningham, Robert Carlyle, Ian Somerhalder. 95min.
   A propaganda da Mastercard pode até não faltar com a verdade, mas, convenhamos: há muito mais coisas sujeitas ao poder do dinheiro do que abstrações incorruptíveis. Mais: quando tem-se dinheiro, tudo parece estar ao alcance. Nenhum aparente devaneio é quimérico o suficiente para incapacitá-lo de vir a tornar-se uma realidade. O caso do militar Luiz Felippe Dias de Andrade Monteiro, falecido em fevereiro deste ano, é um exemplo. O engenheiro civil da FAB desejava ter o corpo congelado após sua morte, na esperança de que um dia pudesse ser ressuscitado, caso a Ciência eventualmente atingisse tal capacidade. Uma de suas filhas, disposta a realizar o sonho do pai, estaria desembolsando R$ 900, 00 por dia para que uma funerária carioca mantivesse o cadáver de seu genitor conservado a gelo seco. A idéia, na verdade, seria transportá-lo para os EUA, onde uma empresa especializada em CRIOGENIA assumiria a responsabilidade pelo congelamento do corpo.
   Se o leitor considera o 'método' acima uma forma imaginativa de 'queimar' dinheiro, certamente desconhece algumas bizarrices perpetradas por certos personagens do fantasioso universo cinematográfico. Em O ALVO, por exemplo, estréia do diretor John Woo em Hollywood, ricaços pagavam para caçar humanos; em O ALBERGUE, fortunas eram dispensadas em prol do prazer da tortura; já em TÁ TODO MUNDO LOUCO!, um abastado administrador de cassinos gastava seu tempo (e dinheiro) propondo as mais bisonhas apostas.
   Neste VINGANÇA ENTRE ASSASSINOS, mais um exuberante esbanjamento é apresentado: aqui, os endinheirados organizam um torneio cujos participantes são todos matadores profissionais. A competição é realizada a cada sete anos e o vencedor deve ser o único sobrevivente. Acobertado pelo governo, o evento já teria sido, inclusive, sediado no Brasil - no fictício município de Shirao (?!).
   O mote é simples, mas, se o espectador deter-se apenas àquilo que a produção propõe - ação ininterrupta -, o resultado talvez o surpreenda. A cena da boate, em especial, na qual prostitutas e bêbados são despedaçados em meio à chuva de balas, é certamente uma das mais viscerais dentre as recentes películas do gênero. Tiroteios, explosões, perseguições, dedos decepados e um padre alcoólatra são o carro-chefe de VINGANÇA ENTRE ASSASSINOS; o espectador não deve, portanto, esperar verossimilhança de um filme deste tipo. Assim, acatadas as devidas 'licenças cinematográficas', a estréia em longas-metragens do diretor Scott Mann (que até então havia feito apenas alguns curtas e trabalhos televisivos) traz, ainda, algumas pequenas surpresas. A presença do francês Sebastien Foucan, tido como o criador de uma vertente do parkour chamada 'free running', é uma delas. Ademais, dentre todos os caricatos mercenários aspirantes à premiação de 10 milhões de dólares, aquele de maior destaque é justamente o capanga anárquico em busca do mais puro entretenimento. Para Miles Slade (Ian Somerhalder, o 'Boone' de LOST), o dinheiro é um fim apenas - e não um meio. Ele está ali para (se preciso) aniquilar inocentes, colecionar troféus e, de quebra, derrotar o vencedor da última edição do torneio: Joshua Harlow (Ving Rhames), que, por sua vez, é o tal assassino à procura de justiça. Como tudo tem seu preço, sejamos fervorosos opositores do capitalismo ou não, só resta a Harlow uma única alternativa: pagar para ver. É, amigos, como diria o grande bardo cearense Falcão: 'Dinheiro não é tudo, mas é cem por cento.'


quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Crítica do dia!

QUASE DEUSES (Something the lord made, EUA, 2004).
Direção: Joseph Sargent.
Com: Alan Rickman, Mos Def, Kyra Sedgwick, Gabrielle Union. 110 min.
   Em meados de 2007, um dos descobridores da molécula do DNA, o biólogo americano James Watson, prêmio Nobel de Medicina em 1962, revelou todo um pessimismo em relação ao desenvolvimento do continente africano. Motivo: os negros, basicamente, seriam menos inteligentes do que os brancos. A polêmica idéia provocou um tremendo alvoroço entre geneticistas, sociólogos, antropólogos e outros especialistas. Esta não era, porém, a primeira ocasião na qual Watson causava frisson: entre outras coisas, ele já havia defendido, por exemplo, a terapia genética para embelezar mulheres feias e o direito ao aborto - caso fosse possível prever, geneticamente, se uma criança seria homossexual (Cláudia Leitte provavelmente abortaria...).
    Este QUASE DEUSES apresenta um contra-exemplo para o leigo discurso racista de Watson: o filme conta a história de Vivien Thomas (Mos Def), um marceneiro negro às voltas com a penúria ocasionada pela Grande Depressão de 1929. Desempregado, Vivien aceita o emprego de zelador laboratorial ofertado pelo médico Alfred Blalock (Alan Rickman). Com o passar do tempo, o marceneiro revela-se um competente assistente para as pesquisas realizadas por seu empregador. Mais: auto-didata, Vivien passa a estudar com afinco e, em certas situações, executa algumas intervenções cirúrgicas.
   O rapper Mos Def entrega uma interpretação digna de nota - alguns traquejos na execução dos textos, no entanto, soam como uma espécie de rima, maculando um pouco o trabalho do ator. Alan Rickman, por sua vez, dispõe ao seu personagem a dosagem exata de elegância e prepotência, qualidades associadas à perícia cirúrgica e ao racismo enrustido - afinal de contas, um negro não poderia protagonizar a descoberta da cura para a chamada Tetralogia de Fallot, não é mesmo? Bom, por falar em jargões médicos, segue uma dica: o espectador não deve ater-se ao palavreado técnico predominante. A Navalha de Ockham, um princípio lógico atribuído ao frade franciscano inglês William Ockham, sugere optar pela simplicidade - é perfeitamente inteligível que uma 'troca de encanamento' restaure o coração de um bebê enfermo, não?
   Se a produção da HBO capricha na grandiloquência, o mesmo não se pode dizer das péssimas maquiagens: aqui, barba, cabelo e bigode não foram suficientes, por exemplo, para transparecer o envelhecimento de Vivien.
   Além da costumeira jornada de superação e reconhecimento (que vale uma conferida, diga-se de passagem), há, em QUASE DEUSES, uma intrigante temática brevemente discutida: o BIOLOGOS - a crença de que Deus teria estabelecido todos os princípios e diretrizes do Universo e que, entendendo melhor os mecanismos deste (através do conhecimento científico, por exemplo), o homem alcançaria algum tipo de conexão com o Criador. A despeito da retórica de Watson, é notável que um negro tenha experimentado tal elo.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Crítica do dia!

MISSÃO: IMPOSSÍVEL 3 (Mission: Impossible 3, EUA, 2006).
Direção: J.J. Abrams.
Com: Tom Cruise, Philip Seymour Hoffman, Michelle Monaghan, Billy Crudup, Laurence Fishburne, Ving Rhames, Jonathan Rhys Meyers, Simon Pegg. 126 min.
   A abertura de MISSÃO IMPOSSÍVEL 3 denuncia o filmaço que está por vir: Ethan e sua esposa Julia estão presos e à mercê do mais amedrontador inimigo que a franquia já concebeu. Pronto: após o flashforward, o imaginário do espectador passa a tentar desvendar a sequência de eventos que culminarão na cena acima descrita - é claro que, até que isto aconteça, algumas máscaras serão forjadas, muitos carros (e personagens) voarão pelos ares e, obviamente, rola aquela mentirinha aqui e ali (um caça ser derrubado por uma única metralhadora, por exemplo).
   Distante das atividades de campo, Ethan Hunt é o responsável pelo treinamento dos novos futuros agentes da IMF (Impossible Missions Force). Quando é informado da captura de um de seus pupilos, Ethan decide participar de uma perigosa missão de resgate. A partir daí, Hunt vê-se envolvido numa trama de interesses e corrupção, tornando-se o inimigo número 1 de Owen Davian (Philip Seymour Hoffman, ótimo), um poderoso fornecedor de armas de nações beligerantes.
   MI-3, como seus predecessores, carrega em si, um caráter, digamos, multinacional; há locações em vários países (Alemanha e Vaticano, por exemplo), mas uma delas merece destaque: a sequência em Chesapeake Bay´s é uma das mais bem filmadas cenas de ação dos últimos tempos. Mais: amparada pela excelente trilha de Michael Giacchino, a correria de Cruise (como sempre, dispensando dublês) torna-se ainda mais contagiante.
   Por falar em Michael Giacchino, a estreita relação de LOST com MI-3 não resume-se apenas à musicalidade: o filme conta com a direção firme e competente de J.J. Abrams, um dos idealizadores do mítico seriado televisivo. Após as saídas de David Fincher e Joe Carnahan (supostamente, em função das velhas divergências artísticas com Cruise), Abrams assumiu a cadeira e fez com que a franquia MI-3 desse maior relevância aos seus personagens: uma característica também presente em LOST - apesar da pluralidade temática, o foco da série está nos conflitos de seus protagonistas. Contudo, a maior (e mais óbvia) contribuição de LOST para MI-3 seja talvez a cena em que Ethan está entre a vida e a morte (ou você já esqueceu como Jack e Kate salvam a vida de Charlie?). As colaborações para MI-3, no entanto, não vêm apenas da televisão: até em Hitchcock Abrams foi buscar inspiração. Aqui, os famosos MacGuffins - pequenos mistérios que servem apenas para desviar a atenção do espectador - estão representados pelo controverso 'pé-de-coelho'.
   O fato é que Abrams empreendeu inteligentemente os 150 milhões de dólares postos à sua disposição, e, trabalhando com vários parceiros de outrora (como os roteiristas Alex Kurtzman e Roberto Orci), o cineasta, após os 126 minutos de projeção, ainda faz pairar uma pequena dúvida no ar: afinal de contas, o que diabos é o 'pé-de-coelho'?